Ruptura ideológico- comportamental com a idade média.
Penso que apesar de todo desenvolvimento tecnológico e do avanço gigantesco na tecnologia da informação, certas estruturas de pensamento e comportamento não tiveram mudanças tão significativas, sendo que as raízes desse modo de viver e pensar podem estar associados à vida, aparentemente pacata, do período histórico denominado idade média.
A questão do livre arbítrio.
Na idade média na Europa ocidental (o que restou do império romano do ocidente) o aspecto religioso se impunha se sobrepondo a tudo e todos. Ou seja, nada tinha tanta importância quanto a religião, sendo que o catolicismo (única existente naquela região) monopolizava tudo e comandava o modo de agir e pensar das pessoas em geral. E ai daquele (ou daquela principalmente) que ousasse um comportamento fora dos padrões, expressasse um pensamento não condizente com a doutrina católica ou mesmo dissesse um questionamento ao comportamento dos párocos, da igreja, dos dogmas. A "santa inquisição" era uma fogueira eterna que nunca cessava de queimar os ditos hereges.
Assim, muitos homossexuais, curandeiras (chamadas de bruxas), médiuns (pessoas que percebem presenças espirituais) e até mesmo os raros "cientistas" da época, que em verdade eram filósofos saídos do seio da própria igreja católica foram queimados da maldade católica.
Diante do exposto, se depreende que buscar autonomia de pensamento era extremamente perigoso e potencialmente letal. Desse modo, a capacidade de pensar e agir de maneira autônoma era terceirizado, sendo que todos deviam seguir os ditames da mega autoritária igreja católica personificada nas aldeias agrícolas (lugares onde viviam a esmagadora maioria da população) na figura do sacerdote. Estes tinham imensa autoridade sobre a vida das pessoas em geral, sendo que o senhor feudal (dono das terras) era também uma autoridade em seus domínios.
Falar de livre arbítrio nesse período histórico era até perigoso e quase toda população tinha que ser guiada pela igreja. O povo era, então, um rebanho de analfabetos, pois inexistiam escolas, que se deixava guiar sem medo, pois se sentiam confortáveis já que achavam que seguiam os ditames do próprio Deus, confundido com o papa, com a igreja, com a figura sacerdotal. Essa situação de se deixar levar é alienante, mas ao mesmo tempo é cômodo viver desse modo, pois diminui consideravelmente nossa responsabilidade pelos nossos destinos e vamos deixando tudo a cargo de outras pessoas, ou seja vamos terceirizando nossa própria existência o que também gera consequências, visto que, se acomodar também é uma escolha que fazemos.
Séculos de repetição de padrões.
A idade média durou quase mil anos, mas o modelo social relatado acima não foi exclusividade desse período histórico, pois na idade moderna, mesmo com todos os avanços como o renascimento urbano (ressurgimento das cidades e a criação de muitas outras), o renascimento cultural, a reforma protestante, o incremento na trocas comerciais, o surgimento de bancos etc, a igreja católica continuava muito forte política e economicamente e no imaginário das pessoas ainda era a personificação de deus na terra e tinha e, assim, detinha o direito de ditar os modos de agir e pensar. É bom lembrar que essa tarefa era facilitada pelo onipresente analfabetismo em massa, já que a esmagadora maioria da população ainda não frequentava escola, pois estas ainda eram raras nesse período.
Em suma, os séculos passaram, muitas coisas mudaram, mas as estruturas básicas de pensamento da Europa feudal pouco se alteraram e as pessoas continuavam acomodadas a uma vida pacata e terceirizando sua sagrada capacidade de pensar e agir livremente.
A reforma luterana até deu um impulso na educação em lugares onde seriam a futura Alemanha, pois ler e interpretar as escrituras eram direitos de cada indivíduo, segundo Lutero, mas tais iniciativas, de maneira geral, atingiram um público restrito num local e num contexto específico, apesar da sua importância de longo prazo.
A ciência e suposta libertação do homem
A revolução francesa propunha essa ruptura com a igreja católica, mas, após dez anos de profundas mudanças, de milhares de execuções sumárias e de um legado indelével de leis que mudariam para sempre a estrutura de pensamento no mundo ocidental, a igreja ainda permanece fortíssima e se mantém-se quase impoluta no pensamento popular, pois o povo, na sua maioria, ainda não quer pagar o preço de ser livre.
A ciência chega prometendo a felicidade por meio do conhecimento e muitas pessoas embarcam no discurso científico, pois a busca da felicidade é o principal objetivo do ser humano. No século XIX, muitas pessoas não aceitam mais o controle ideológico da igreja e buscam preencher essa lacuna na ciência e acabam matando quaisquer crenças no transcendente o que se configura como uma escolha equivocada, pois a ciência não trouxe a felicidade desejada e deixou nas pessoas um grande vazio, um vácuo que até hoje não foi preenchido. Talvez isso explique um retorno em massa ao fanatismo de outrora, mas isso é um assunto para depois.
As guerras como fruto do egoísmo
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