A humildade é um caminho fundamental para aprender e crescer.

Durante anos trabalhei na área tecnológica, mas me sentia um peixe fora d'água e, talvez meu entendimento de me sentir no lugar errado tivesse uma explicação relacionada à busca mais premente, talvez desesperada de afeto. Mas eu ainda não sabia disso.

- Mas você já não tinha afeto da sua família, da sua companheira, da sua filha mais velha?

- É verdade! Eu tinha tais afetos que até preenchiam de alguma forma essa minha "carência", mas eu queria mais e talvez essa insatisfação passasse por aí.

- Mas uma aproximação emocional maior com os "afetos de casa" talvez preenchesse em grande parte esse vazio.

- Concordo que me descuidei de alimentar o afeto da minha companheira que sempre se doou por completo numa relação onde não tinha muita reciprocidade. Fui negligente nesse aspecto e reconheço isso. 


Apesar dos afetos domésticos, eu queria mais, mesmo que isso ainda não estivesse claro para mim naquele momento. Eu queria estar próximo de muitas pessoas, ser admirado, querido e ter no meu trabalho essa troca constante de afetos. Mas eu sabia das minhas dificuldades...

- Você é um sujeito orgulhoso e queria ser o centro das atenções!

- Isso, mexa na minha ferida mesmo! Eu reconheço que você está com a razão. É verdade, eu gosto de ser o centro das atenções mesmo. Mas a vida, na presente existência, me deu alguns "obstáculos"
 para que isso fosse evitado de alguma forma.

- Como assim?

- É que, no passado, sinto isso dentro de mim, já cometi muitos enganos por ser, de alguma forma,  o centro das atenções. Agora,  renasci num ambiente estranho, sendo o mais esquisito dos filhos numa família disfuncional, onde carinho, afeto, diálogo eram conceitos desconhecidos.

- Mas você está reclamando do que a vida lhe deu pelo seu próprio mérito?

- De jeito nenhum! Já não posso recorrer aos lamentos, pois sei que a vida é sempre justa. Um espírito orgulhoso tem que aprender na prática as consequências do seu orgulho demasiado e da arrogância no trato com os demais seres humanos. 

Mas, apesar das dificuldades,  a vida me deu oportunidade de estudar, de fazer faculdade e me tornar educador, mesmo eu não tendo desenvolvido a disciplina necessária para dar conta das exigências de uma profissão tão complexa. Eu sabia das minhas dificuldades de adaptação na convivência 
em grupos, da minha teimosia, da arrogância de me achar sempre com razão etc. Mas, ainda assim, resolvi encarar o desafio de ser educador. 

Duas décadas depois,  vejo que as dificuldades foram muitas e tantas coisas 
que já poderiam ter melhorado se eu fosse mais maleável ainda causam sobrecargas no meu psiquismo já cansado por tantas demandas e sobrecargas.

Uma das coisas que começo a compreender agora é que todos temos habilidades que desenvolvemos ao longo da vida e que nossa família de alguma forma também nos ajuda no desenvolvimento de tais atributos. Mas tudo é fruto do mérito ou demérito de cada um.

Na lida diária em sala de aula, ganhei muito no aspecto afetivo, sendo isso o que vou levar de mais importante para minha existência, pois  consegui desenvolver meu aspecto afetivo e estou me tornando, gradativa e lentamente um ser humano mais consciente. Mas, com o orgulho que me é peculiar, já sofri muito me comparando com outros seres humanos que tem outros atributos, pois tem trajetórias igualmente diferentes da minha.

Então, muito já sofri, desnecessariamente, por causa da comparação às vezes invejosa que, involuntariamente, fazemos das nossas habilidades com a de outros seres humanos. 
Às vezes um professor neófito consegue um controle melhor na frente da turma, pois tem, naturalmente, uma postura mais adequada. Olhava para isso e me cobrava ( e ainda faço isso em alguns momentos), mas começo a ver essa postura (de invejar) como inadequada, pois agora tenho a  compreensão que somos espíritos imortais e cada se desenvolveu nesse ou naquele aspecto e temos que ser humildes algumas vezes para estar dispostos a aprender certas habilidades de que ainda carecemos. Entendo agora que isso não tem a ver com incapacidade, mas com trajetória, sendo essa uma compreensão fundamental para seguirmos em frente e aprendendo sempre.

O menino Francisco, desligado, desatento, com uma falta de atenção aguda que era até interpretada como dificuldade cognitiva, tem muito a ensinar o homem Francisco que se conectou mais com seu longínquo passado orgulhoso de outras hipotéticas existências  que com seu passado recente de carências e faltas, mas também de singeleza e simplicidade.

Estou quase fechando um ciclo, pois em breve vou deixar de trabalhar com os pequenos (crianças e adolescentes do sexto ao nono ano), embora alguns não sejam tão pequenos assim. Porém, continuarei minha trajetória no outro campo de batalha no qual os estudantes estão, em grande parte, na idade adulta. 

O cansaço será menor, mas o desafio de aprendizado é igualmente enorme, pois sei das minhas dificuldades no convívio com outros seres humanos. Vou poder focar mais no meu aprendizado e estar disposto a dizer sempre que necessário: 

PRECISO ME DESENVOLVER NESSE ASPECTO TAMBÉM. 

Só assim, farei dessa nova etapa da minha vida uma fase de aprendizado e de crescimento pessoal.




Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Rejeições, criança ferida, traumas do passado...

Vamos aprender com nossos erros ?

Livre arbítrio, sofrimento, escolhas...